Primeira medida da interação entre o bóson de Higgs e múons é anunciada pelo CERN
Resultado, considerado um dos mais importantes obtidos pela Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear, pode abrir portas para o estudo das interações entre o bóson de Higgs e partículas de massa menor
A Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN) anunciou nesta segunda-feira (03/07) a primeira medida da interação entre o bóson de Higgs e o múon, partícula “prima” do elétron, porém mais pesada. O resultado, considerado um dos mais importantes obtidos pelo CERN desde a descoberta do próprio bóson de Higgs em 2012, pode abrir portas para o estudo da interação entre o bóson e as partículas mais leves.
O bóson de Higgs é o quantum do campo de Higgs, responsável por fornecer massa para todas as demais partículas que conhecemos. A partícula pode ser formada em colisões de prótons realizadas no Large Hadron Collider (LHC), o acelerador de partículas do CERN. Entretanto, ela decai rapidamente em outras partículas elementares. A taxa de decaimento do bóson fornece informações sobre a força de interação entre o campo de Higgs e a partícula formada no decaimento. Desta forma, é possível verificar como funciona o mecanismo pelo qual as partículas fundamentais adquirem massa e comparar com as previsões teóricas do Modelo Padrão da Física de Partículas.
O bóson de Higgs acopla-se a todas as partículas elementares com uma intensidade que é proporcional à massa dessas partículas. Assim, o Higgs acopla-se mais fortemente às partículas fundamentais mais pesadas como os bósons W e Z, os quarks top e bottom, e o lépton tau. A interação do bóson de Higgs com o múon, um lépton da segunda geração, era considerada a próxima fronteira a ser explorada e poderia avançar o conhecimento sobre as interações entre o bóson e partículas mais leves.
Entre as grandes dificuldades para realizar estudos como esse está o fato de que a chance de um bóson de Higgs decair em múons é cerca de uma em 5 mil. Além disso, quando o decaimento de fato acontece, ainda há outros mil pares de múons que são gerados pelo decaimento de outras partículas, como o bóson Z, e que precisam ser identificados e isolados.
Para superar esses obstáculos, o detector Compact Muon Solenoid (CMS) do LHC, especializado em detecção de múons, utiliza um sistema de rastreamento dessas partículas de grande precisão. Esse sistema detecta múons quando passam pelo campo magnético de 3,8 Tesla, cerca de 100 mil vezes mais forte do que o campo magnético da Terra. O detector do CMS consegue, então, “reconstruir” o múon detectado com grande precisão. Estas tecnologias permitiram aos cientistas obter a primeira evidência da interação do campo de Higgs com múons.
Como ressalta o Prof. Sérgio Novaes, líder do São Paulo Research and Analysis Center (SPRACE), “depois da descoberta do bóson de Higgs, um dos resultados mais impressionantes obtido pelas colaborações do CERN é o acordo entre a predição do Modelo Padrão e a medida experimental para os acoplamentos do Higgs a todas as partículas pesadas. Agora temos a possibilidade de estender essa comparação para partículas mais leves como o múon. O fato de o CMS ter obtido essa medida complexa com 3 desvios padrão é mais uma demonstração do alcance do detector para explorar os detalhes do mecanismo de Higgs”.
A precisão da medida da interação entre o bóson de Higgs e múons é limitada apenas pela quantidade de dados obtida até o momento. Esta quantidade deve dobrar ao longo da próxima etapa de coleta de dados do LHC, que está prevista para começar em 2021. A longo prazo, o CERN prepara seu acelerador de partículas para um grande upgrade, que mudará o nome do LHC para HL-LHC (High-Luminosity LHC). Nesta nova fase, prevista para 2027, o acelerador deverá aumentar a produção de dados em 10 vezes. Desta forma, não apenas a medida da interação do bóson de Higgs com múons, como outras análises, poderão ser feitas com precisão muito maior e nos permitirão conhecer ainda melhor como o universo funciona em suas menores escalas.